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René Guénon

Os Princípios do Cálculo Infinitesimal
Prefácio, Capítulos I e II

(Tradução: Luiz Gambogi )

"Les Principes du Calcul Infinitésimal" (Paris, 1946)

Calculo

PREFÁCIO

Ainda que o presente estudo possa parecer, à primeira vista ao menos, não ter mais que um caráter um pouco «especial», pareceu-nos útil empreender-lhe para precisar e explicar mais completamente algumas noções que nos sucedeu mencionar nas diversas ocasiões que nos servimos do simbolismo matemático, e esta razão bastaria em suma para justificar-lhe sem que tenha lugar a insistir mais nisso. Não obstante, devemos dizer que a isso se agregam também outras razões secundárias, que concernem sobretudo ao que se poderia chamar o lado «histórico» da questão; efetivamente, este não está inteiramente desprovido de interesse desde nosso ponto de vista, no sentido de que todas as discussões que se suscitaram sobre o tema da natureza e do valor do cálculo infinitesimal oferecem um exemplo contundente dessa ausência de princípios que caracteriza às ciências profanas, isto é, as únicas ciências que os modernos conhecem e que inclusive concebem como possíveis. Já observamos freqüentemente que a maioria dessas ciências, na medida inclusive em que correspondem ainda a alguma realidade, não representam nada mais que simples resíduos desnaturalizados de algumas das antigas ciências tradicionais: é a parte mais inferior destas, a que, tendo cessado de ser posta em relação com os princípios, e tendo perdido por isso sua verdadeira significação original, acabou por tomar um desenvolvimento independente e por ser considerada como um conhecimento que se basta a si mesmo, ainda que, certamente, seu valor próprio como conhecimento, precisamente por isso mesmo, encontra-se reduzido a quase nada. Isso é evidente sobretudo quando se trata das ciências físicas, mas, como explicamos em outra parte, (1) as matemáticas modernas mesmas não constituem nenhuma exceção sob este aspecto, se se as compara ao que eram para os antigos a ciência dos números e a geometria; e, quando falamos aqui dos antigos, nisso é mister compreender inclusive a antigüidade «clássica», como um mínimo estudo das teorias pitagóricas e platônicas basta para mostrá-lo, ou o deveria ao menos se não fosse mister contar com a extraordinária incompreensão daqueles que pretendem interpretá-las hoje em dia. Se essa incompreensão não fora tão completa, ¿como se poderia sustentar, por exemplo, a opinião de uma origem «empírica» das ciências em questão, enquanto, em realidade, aparecem ao contrário tanto mais afastadas de todo «empirismo» quanto mais atrás nos remontamos no tempo, assim como ocorre igualmente com todo outro ramo do conhecimento científico?

Os matemáticos, na época moderna, e mais particularmente ainda na época contemporânea, parecem ter chegado a ignorar o que é verdadeiramente o número; e, nisso, não estamos falando só do número tomado no sentido analógico e simbólico em que o entendiam os Pitagóricos e os Cabalistas, o que é muito evidente, senão inclusive, o que pode parecer mais estranho e quase paradoxal, do número em sua acepção simples e propriamente quantitativa. Efetivamente, os matemáticos modernos reduzem toda sua ciência ao cálculo, segundo a concepção mais estreita do que se possa fazer dele, isto é, considerado como um simples conjunto de procedimentos mais ou menos artificiais, e que não valem em suma mais do que pelas aplicações práticas às que dá motivo; no fundo, isso equivale a dizer que substituem o número pela cifra e, ademais, esta confusão do número com a cifra está tão extendida em nossos dias que se poderia encontrá-la facilmente a cada instante até nas expressões da linguagem corrente (2) . Agora bem, em todo rigor, a cifra não é nada mais que a vestimenta do número; nem sequer dizemos seu corpo, já que, em certos aspectos, é mais corretamente a forma geométrica a que pode considerar-se legitimamente como constituindo o verdadeiro corpo do número, assim como o mostram as teorias dos antigos sobre os polígonos e os poliedros, postos em relação direta com o simbolismo dos números; e, ademais, isto concorda com o fato de que toda «incorporação» implica necessariamente uma «espacialização». Não obstante, não queremos dizer que as cifras mesmas sejam signos inteiramente arbitrários, cuja forma não teria sido determinada mais do que pela fantasia de um ou de vários indivíduos; com os caracteres numéricos deve ocorrer o mesmo que com os caracteres alfabéticos, dos que, em algumas línguas, não se distinguem (3), e se pode aplicar a uns tanto como aos outros a noção de uma origem hieroglífica, isto é, ideográfica ou simbólica, que vale para todas as escrituras sem exceção, por dissimulado que possa estar esta origem em alguns casos devido a deformações ou alterações mais ou menos recentes.

O que há de certo, é que os matemáticos empregam em sua notação símbolos cujo sentido já não conhecem, e que são como vestígios de tradições esquecidas; e o que é mais grave, é que não só não se perguntam qual pode ser esse sentido, senão que nem sequer parecem querer que tenham algum. Efetivamente, tendem cada vez mais a considerar toda notação como uma simples «convenção», pela qual entendem algo que está proposto de uma maneira inteiramente arbitrária, o que, no fundo, é uma verdadeira impossibilidade, já que jamais se faz uma convenção qualquer sem ter alguma razão para fazê-la, e para fazer precisamente essa mais bem do que qualquer outra; é só àqueles que ignoram essa razão a quem a convenção pode parecer-lhes arbitrária, de igual modo que não é senão àqueles que ignoram as causas de um acontecimento a quem este pode parecer-lhes «fortuito»; efetivamente, isso é o que se produz aqui, e se pode ver nisso uma das conseqüências mais extremas da ausência de todo princípio, ausência que chega até fazer perder à ciência, ou supostamente tal, pois então já não merece verdadeiramente esse nome sob nenhum aspecto, toda significação plausível.

Ademais, devido ao fato mesmo da concepção atual de uma ciência exclusivamente quantitativa, esse «convencionalismo» se estende pouco a pouco desde as matemáticas às ciências físicas, em suas teorias mais recentes, que assim se afastam cada vez mais da realidade que pretendem explicar; insistimos suficientemente sobre isto em outra obra como para dispensar-nos de dizer nada mais a este respeito, tanto mais quanto que é só das matemáticas do que vamos ocupar-nos agora mais particularmente. Desde este ponto de vista, só acrecentaremos que, quando se perde tão completamente de vista o sentido de uma notação, é muito fácil passar do uso legítimo e válido desta a um uso ilegítimo, que já não corresponde efetivamente a nada, e que às vezes pode ser inclusive completamente ilógico; isto pode parecer bastante extraordinário quando se trata de uma ciência como as matemáticas, que deveria ter com a lógica laços particularmente estreitos, e, no entanto, é muito certo que se podem assinalar múltiplos ilogismos nas noções matemáticas tais como se consideram comumente em nossa época.

Um dos exemplos mais destacáveis dessas noções ilógicas, e que teremos que considerar aqui antes de mais nada, ainda que não será o único que encontraremos no curso de nossa exposição, é o do pretendido infinito matemático ou quantitativo, que é a fonte de quase todas as dificuldades que se suscitaram contra o cálculo infinitesimal, ou, talvez mais exatamente, contra o método infinitesimal, já que nisso há algo que, pensem o que pensem os «convencionalistas», ultrapassa o alcance de um simples «cálculo» no sentido ordinário desta palavra; só há que fazer uma exceção com aquelas, das dificuldades que provém de uma concepção errônea ou insuficiente da noção de «limite», indispensável para justificar o rigor deste método infinitesimal e para fazer dele outra coisa que um simples método de aproximação. Ademais, como o veremos, há que fazer uma distinção entre os casos em que o suposto infinito não expressa mais do que uma absurdidade pura e simples, isto é, uma idéia contraditória em si mesma, como a do «número infinito», e aqueles em que só se emprega de uma maneira abusiva no sentido de indefinido; mas seria mister não crer por isso que a confusão mesma do infinito e do indefinido se reduz a uma simples questão de palavras, já que recai verdadeiramente sobre as idéias mesmas. O que é singular, é que esta confusão, que tivesse bastado dissipar para atalhar tantas discussões, tenha sido cometida por Leibnitz mesmo, a quem se considera geralmente como o inventor do cálculo infinitesimal, e a quem chamaríamos mais corretamente seu «formulador», já que este método corresponde a algumas realidades, que, como tais, têm uma existência independente daquele que as concebe e que as expressa mais ou menos perfeitamente; as realidades de ordem matemática, como todas as demais, só podem ser descobertas e não inventadas, enquanto, pelo contrário, é de «invenção» do que se trata quando, assim como ocorre muito freqüentemente neste domínio, alguém se deixa arrastar, devido a um «jogo» de notação, à fantasia pura; mas, certamente, seria muito difícil fazer compreender esta diferença a matemáticos que se imaginam gostosamente que toda sua ciência não é nem deve ser nada mais que uma «construção do espírito humano», o que, se fosse mister crer-lhes, a reduziria certamente a ser muito pouca coisa em realidade. Seja como seja, Leibnitz não soube nunca se explicar claramente sobre os princípios de seu cálculo, e isso é o que mostra que tinha algo nesse cálculo que lhe ultrapassava e que se impunha em certo modo a ele sem que tivesse consciência disso; se se tivesse dado conta, certamente não teria se enredado numa disputa de «prioridade» sobre este tema com Newton, e, ademais, esse tipo de disputas são sempre perfeitamente vãs, já que as idéias, enquanto são verdadeiras, não poderiam ser a propriedade de ninguém, apesar do «individualismo» moderno, já que é só o erro o que pode atribuir-se propriamente aos indivíduos humanos. Não nos estenderemos mais sobre esta questão, que poderia levarnos bastante longe do objeto de nosso estudo, ainda que quiçá não seja inútil, em alguns aspectos, fazer compreender que o papel do que se chama os «grandes homens» é freqüentemente, numa boa medida, um papel de «receptores», de sorte que, geralmente, eles mesmos são os primeiros em iludir-se sobre sua «originalidade».

O que nos concerne mais diretamente pelo momento, é isto: se temos que constatar tais insuficiências em Leibnitz, e insuficiências tanto mais graves quanto que recaem especialmente sobre as questões de princípios, ¿que será então com os demais filósofos e matemáticos modernos, aos que, certamente, Leibnitz é muito superior apesar de tudo? Esta superioridade, deve-se, por uma parte, ao estudo que tinha feito das doutrinas escolásticas da idade média, ainda que nem sempre as tenha compreendido inteiramente, e, por outra, a alguns dados esotéricos, de origem ou de inspiração principalmente rosacruciana (4), dados evidentemente muito incompletos e inclusive fragmentários, e que, ademais, às vezes lhe ocorreu aplicar bastante mal, como veremos alguns exemplos disso aqui mesmo; para falar como os historiadores, é a estas duas «fontes» às que convém referir, em definitivo, quase tudo o que há de realmente válido em suas teorias, e isso é também o que lhe permite responder, ainda que imperfeitamente, contra o cartesianismo, que representava então, no duplo domínio filosófico e científico, todo o conjunto das tendências e das concepções mais especificamente modernas. Esta precisão basta em suma para explicar, em poucas palavras, tudo o que foi Leibnitz, e, se se lhe quer compreender, seria necessário não perder de vista nunca estas indicações gerais, que, por esta razão, cremos bom formular desde o começo; mas é tempo de deixar estas considerações preliminares para entrar no exame das questões mesmas que nos permitirão determinar a verdadeira significação do cálculo infinitesimal.

Notas:

1) Ver O Reino da Quantidade e os Sinais dos Tempos.

2) ¡Ocorre o mesmo com os «pseudo-esoteristas» que sabem tão pouco do que querem falar que nunca deixam de cometer esta mesma confusão nas elucubrações fantásticas com as que têm a pretensão de substituir à ciência tradicional dos números!

3) O hebreu e o grego estão nesse caso, e o árabe o estava igualmente antes da introdução do uso das cifras de origem hindu, que depois, modificando-se mais ou menos, passaram daí à Europa da idade média; pode-se destacar a este propósito que a palavra «cifra» mesma não é outra coisa que o árabe ifr, ainda que este não seja em realidade mas que a designação do zero. Por outra parte, é verdade que em hebreu, saphar significa «contar» ou «numerar» ao mesmo tempo que «escrever», de onde sepher «escritura» ou «livro» (em árabe sifr, que designa particularmente um livro sagrado), e sephar, «numeração» ou «cálculo»; desta última palavra vem também a designação dos Sephiroth da Cabala, que são as «numerações» principais assimiladas aos atributos divinos.

4) A marca inegável dessa origem se encontra na figura hermética colocada por Leibnitz na portada de seu tratado Da Arte combinatória: é uma representação da Rota Mundi, na que, no centro da dupla cruz dos elementos (fogo e água, ar e terra) e das qualidades (quente e frio, seco e úmido), a quinta essência está simbolizada por uma rosa de cinco pétalas (que corresponde ao éter considerado em si mesmo como princípio dos outros quatro elementos); ¡naturalmente, esta insígnia passou completamente despercebida para todos os comentadores universitários!

CAPÍTULO I - INFINITO E INDEFINIDO

Procedendo em certo modo em sentido inverso da ciência profana, devemos, segundo o ponto de vista constante de toda ciência tradicional, estabelecer aqui antes de mais nada o princípio que nos permitirá resolver depois, de uma maneira quase imediata, as dificuldades às que deu lugar o método infinitesimal, sem deixar-nos extraviar nas discussões que de outro modo correriam o risco de ser intermináveis, como o são em efeito para os filósofos e os matemáticos modernos, que, pelo fato mesmo de que lhes falta este princípio, não chegaram nunca a apresentar uma solução satisfatória e definitiva a estas dificuldades. Este princípio, é a idéia mesma do Infinito entendido em seu único sentido verdadeiro, que é o sentido puramente metafísico, e, ademais, sobre este ponto, não temos mais do que recordar sumariamente o que já expusemos mais completamente em outra parte5: o Infinito é propriamente o que não tem limites, já que finito é evidentemente sinônimo de limitado; portanto, não se pode aplicar sem abuso esta palavra a outra coisa que ao que não tem absolutamente nenhum limite, isto é, ao Todo universal que inclui em si mesmo todas as possibilidades, e que, portanto, não poderia ser limitado de nenhuma maneira por nada; entendido assim, o Infinito é metafísica e logicamente necessário, já que não só não pode implicar nenhuma contradição, já que não encerra em si mesmo nada de negativo, senão que é, ao contrário, sua negação a que seria contraditória. Ademais, evidentemente não pode ter mais do que um Infinito, já que dois Infinitos supostos distintos se limitariam um ao outro, e portanto, se excluiriam forçosamente; portanto, toda vez que a palavra «infinito» se emprega em um sentido diferente do que acabamos de dizer, podemos estar seguros a priori de que esse emprego é necessariamente abusivo, já que, em suma, equivale a ignorar pura e simplesmente o Infinito metafísico, ou a supor outro infinito ao lado dele.

É verdade que os escolásticos admitiam o que chamavam infinitum secundum quid, que distinguiam cuidadosamente do infinitum absolutum que é unicamente o Infinito metafísico; mas nisso não podemos ver mais do que uma imperfeição de sua terminologia, já que, se esta distinção lhes permitia escapar à contradição de uma pluralidade de infinitos entendidos no sentido próprio, não é menos certo que esse duplo emprego da palavra infinitum corria o risco de causar múltiplas confusões, já que, ademais, um dos sentidos que lhe davam assim era completamente impróprio, já que dizer que algo é infinito só sob um certo aspecto, o que é a significação exata da expressão Infinitum secundum quid, isto é, que em realidade não é infinito de nenhuma maneira (6). Efetivamente, não é porque uma coisa não está limitada em um certo sentido ou sob uma certa relação pelo que se pode concluir legitimamente que não está limitada de nenhuma maneira, o que seria necessário para que fora verdadeiramente infinita; não só pode estar limitada ao mesmo tempo sob outros aspectos, senão que inclusive podemos dizer que o está necessariamente, desde que é uma certa coisa determinada, e que, por sua determinação mesma, não inclui toda possibilidade, já que isso mesmo equivale a dizer que está limitada pelo que deixa fora dela; ao contrário, se o Todo universal é infinito, é precisamente porque não deixa nada fora dele (7). Por conseguinte, toda determinação, por geral que se a suponha, e qualquer que seja a extensão que possa receber, é necessariamente excluída da verdadeira noção de infinito (8); uma determinação, qualquer que seja, é sempre uma limitação, já que tem como caráter essencial definir um certo domínio de possibilidades em relação a todo o resto, e porque, por isso mesmo, exclui a todo esse resto. Assim, há um verdadeiro despropósito em aplicar a idéia de infinito a uma determinação qualquer, por exemplo, no caso que vamos considerar aqui mais especialmente, à quantidade ou a um ou outro de seus modos; a idéia de um «infinito determinado» é demasiado manifestamente contraditória como para que tenha lugar a insistir mais nisso, ainda que esta contradição tenha escapado muito freqüentemente ao pensamento profano dos modernos, e ainda que aqueles mesmos que se poderiam chamar «semiprofanos» como Leibnitz, não tenham sabido aperceber claramente9. Para fazer destacar ainda melhor esta contradição, poderíamos dizer, em outros termos que são equivalentes no fundo, que é evidentemente absurdo querer definir o Infinito: efetivamente, uma definição não é outra coisa que a expressão de uma determinação, e as palavras mesmas dizem bastante claramente que o que é suscetível de ser definido não pode ser mais do que finito ou limitado; procurar fazer entrar o Infinito numa fórmula, ou, se se prefere, revestir-lhe de uma forma qualquer que seja, é, consciente ou inconscientemente, esforçar-se em fazer entrar o Todo universal em um dos elementos mais ínfimos que estão compreendidos nele, o que, certamente, é efetivamente a mais manifesta das impossibilidades.

O que acabamos de dizer basta para estabelecer, sem deixar lugar à menor dúvida, e sem que tenha necessidade de entrar em nenhuma outra consideração, que não pode haver um infinito matemático ou quantitativo, que esta expressão não tem nenhum sentido, porque a quantidade mesma é uma determinação; o número, o espaço, o tempo, aos que se quer aplicar a noção desse pretendido infinito, são condições determinadas, e que, como tais, não podem ser mais do que finitas; são, se se quer, certas possibilidades, ou certos conjuntos de possibilidades, junto aos quais e fora dos quais existem outros, o que implica evidentemente sua limitação. Neste caso, há ainda algo mais: conceber o Infinito quantitativamente, não só é limitar-lhe, senão que é também, por acréscimo, conceber-lhe como suscetível de aumento ou de diminuição, o que não é menos absurdo; com semelhantes considerações, chega-se a considerar rapidamente não só vários infinitos que coexistem sem confundir-se nem excluir-se, senão também infinitos que são maiores ou menores que outros infinitos, e inclusive, já que nestas condições o infinito tornou-se tão relativo que já não basta, inventa-se o «transfinito», isto é, o domínio das quantidades maiores que o infinito; e, efetivamente, é de uma «invenção» do que se trata propriamente então, já que tais concepções não poderiam corresponder a nada real: ¡A tantas palavras, outras tantas absurdidades, inclusive a respeito da simples lógica elementar, o que não impede que, entre aqueles que as sustentam, encontrem-se quem têm a pretensão de ser «especialistas» da lógica, tão grande é a confusão intelectual de nossa época!

Devemos fazer observar que faz um momento dissemos, não só «conceber um infinito quantitativo», senão «conceber o Infinito quantitativamente», e isto requer algumas palavras de explicação: com isso quisemos fazer alusão mais particularmente àqueles que, na gíria filosófica contemporânea, chamam-se os «infinitistas»; efetivamente, todas as discussões entre «finitistas» e «infinitistas» mostram claramente que uns e outros têm ao menos em comum esta idéia completamente falsa de que o Infinito metafísico é solidário do infinito matemático, se é que inclusive não se identifica com ele pura e simplesmente (10). Por conseguinte, todos ignoram igualmente os princípios mais elementares da metafísica, já que é, ao contrário, a concepção mesma do verdadeiro Infinito metafísico a única que permite rechaçar de uma maneira absoluta todo «infinito particular», se pode-se expressar assim, tal como o pretendido infinito quantitativo, e estar seguro de antemão de que, por todas partes onde se lhe encontre, não pode ser mais do que uma ilusão, a cujo respeito já não terá mais que se perguntar o que pôde dar-lhe nascimento, a fim de poder substituí-la por outra noção mais conforme à verdade. Em suma, toda vez que se trate de uma coisa particular, de uma possibilidade determinada, por isso mesmo estamos certos a priori de que é limitada, e, podemos dizer, limitada por sua natureza mesma, e isto permanece igualmente verdadeiro no caso onde, por uma razão qualquer, não podemos alcançar atualmente seus limites; mas é precisamente esta impossibilidade de alcançar os limites de algumas coisas, e inclusive às vezes de concebê-los claramente, a que causa, ao menos naqueles a quem lhes falta o princípio metafísico, a ilusão de que essas coisas não têm limites, e, repetimo-lo ainda, é esta ilusão, e nada mais, a que se formula na afirmação contraditória de um «infinito determinado».

É aqui onde intervém, para retificar essa falsa noção, ou mais corretamente para substituí-la por uma concepção verdadeira das coisas (11), a idéia do indefinido, que é precisamente a idéia de um desenvolvimento de possibilidades cujos limites não podemos alcançar atualmente; e por isso consideramos como fundamental, em todas as questões onde aparece o pretendido infinito matemático, a distinção do Infinito e do indefinido. É sem dúvida a isso ao que respondia, na intenção de seus autores, a distinção escolástica de infinitum absolutum e do infinitum secundum quid; e é certamente deplorável que Leibnitz, que não obstante tomou tanto da escolástica, tenha descuidado ou ignorado esta, já que, por imperfeita que fosse a forma sob a que estava expressada, tivesse podido servir-lhe para responder bastante facilmente a certas objeções suscitadas contra seu método. Pelo contrário, parece que Descartes tinha tentado estabelecer a distinção de que se trata, mas está muito longe de tê-la expressado e inclusive concebido com uma precisão suficiente, já que, segundo ele, o indefinido é aquilo cujos limites não vemos, e que em realidade poderia ser infinito, ainda que não possamos afirmar que o seja, enquanto a verdade é que, ao contrário, podemos afirmar que não o é, e que não há necessidade nenhuma de ver seus limites para estar certos de que esses limites existem; por conseguinte, vê-se quanto vago e embaralhado está tudo isto, e sempre por causa da mesma falta de princípio. Descartes diz efetivamente: «E para nós, ao ver coisas nas que, segundo alguns sentidos (12), não observamos limites, não asseguramos por isso que sejam infinitas, senão que as estimaremos somente indefinidas (13)». E dá como exemplos disso a extensão e a divisibilidade dos corpos; não assegura que estas coisas sejam infinitas, mas não obstante não parece também não querer negá-lo formalmente, tanto mais quanto que chega a declarar que não quer «enredar-se nas disputas do infinito», o que é uma maneira demasiado simples de evitar as dificuldades, e ainda que diga um pouco mais adiante que «conquanto observamos nelas propriedades que nos parecem não ter limites, não deixaremos de reconhecer que isso procede do defeito de nosso entendimento, e não de sua natureza» (14). Em suma, com justa razão, quer reservar o nome de infinito ao que não pode ter nenhum limite; mas, por uma parte, não parece saber, com a certeza absoluta que implica todo conhecimento metafísico, que o que não tem nenhum limite não pode ser nada mais que o Todo universal, e por outra, a noção mesma do indefinido tem necessidade de ser precisada muito mais do que aquela que ele precisa; se o tivesse sido, sem dúvida um grande número de confusões ulteriores não se teriam produzido tão facilmente (15).

Dizemos que o indefinido não pode ser infinito, porque seu conceito implica sempre uma certa determinação, já se trate da extensão, da duração, da divisibilidade, ou de qualquer outra possibilidade; numa palavra, o indefinido, qualquer que seja e sob qualquer aspecto que se o considere, é ainda finito e não pode ser mais do que finito. Sem dúvida, seus limites se afastam até encontrar-se fora de nosso alcance, ao menos enquanto busquemos alcançá-los de uma certa maneira que podemos chamar «analítica», assim como o explicaremos mais completamente a seguir; mas por isso não são suprimidos de nenhuma maneira, e, em todo caso, se as limitações de uma certa ordem podem ser suprimidas, subsistem ainda outras, que estão na natureza mesma do que se considera, já que é em virtude de sua natureza, e não simplesmente de alguma circunstância mais ou menos exterior e acidental, pelo que toda coisa particular é finita, e isso, seja qual seja o grau a que possa ser levada efetivamente a extensão da que é suscetível. Se pode destacar a este propósito que o signo ¥, pelo que os matemáticos representam seu pretendido infinito, é ele mesmo uma figura fechada, e portanto, visivelmente finita, tanto como o é o círculo do que alguns quiseram fazer um símbolo da eternidade, enquanto não pode ser mais do que uma figuração de um ciclo temporário, indefinido somente em sua ordem, isto é, na ordem do que se chama propriamente a perpetuidade (16); e é fácil ver que esta confusão da eternidade e da perpetuidade, tão comum entre os Ocidentais modernos, se parece estreitamente à do Infinito e do indefinido.

Para fazer compreender melhor a idéia do indefinido e a maneira em que este se forma a partir do finito entendido em sua acepção ordinária, pode-se considerar um exemplo tal como a sucessão dos números: nesta, evidentemente não é possível nunca deter-se em um ponto determinado, já que, depois de todo número, há sempre outro que se obtém agregando-lhe a unidade; portanto, é mister que a limitação dessa sucessão indefinida seja de uma ordem diferente do que se aplica a um conjunto definido de números, tomados entre dois números determinados quaisquer; por conseguinte, é mister que essa limitação esteja, não em algumas propriedades particulares de certos números, senão na natureza mesma do número em toda sua generalidade, isto é, na determinação que, ao constituir essencialmente esta natureza, faz ao mesmo tempo que o número seja o que é e que não seja outra coisa. Poderia repetir-se exatamente a mesma observação se se tratasse, não já do número, senão do espaço ou do tempo considerados igualmente em toda a extensão da que são suscetíveis (17); essa extensão, por indefinida que se a conceba e que o seja efetivamente, não poderá fazer-nos sair nunca de nenhuma maneira do finito. É que, efetivamente, enquanto o finito pressupõe necessariamente o Infinito, já que este é o que compreende e envolve todas as possibilidades, o indefinido procede ao contrário do finito, do que não é em realidade mais do que um desenvolvimento, e ao que, por conseguinte, é sempre redutível, já que é evidente que não se pode sacar do finito, por qualquer processo que seja, nada mais que o que já estava contido nele potencialmente. Para retomar o mesmo exemplo da sucessão dos números, podemos dizer que esta sucessão, com toda a indefinidade que implica, nos está dada por sua lei de formação, já que é desta lei mesma de onde resulta imediatamente sua indefinidade; agora bem, esta lei consiste em que, dado um número qualquer, se formará o número seguinte agregando-lhe a unidade. Por conseguinte, a sucessão dos números se forma por adições sucessivas da unidade a si mesma indefinidamente repetida, o que, no fundo, nada mais é do que a extensão indefinida do procedimento de formação de uma soma aritmética qualquer; e aqui se vê muito claramente como o indefinido se forma a partir do finito. Ademais, este exemplo deve sua clareza particular ao caráter descontínuo da continuidade numérica; mas, para tomar as coisas de uma maneira mais geral e aplicável a todos os casos, bastaria, a este respeito, insistir sobre a idéia de «devir» que está implicada pelo termo «indefinido», e que expressamos mais atrás ao falar de um desenvolvimento de possibilidades, desenvolvimento que, em si mesmo e em todo seu curso, implica sempre algo de inacabado (18); a importância da consideração das «variáveis», no que diz respeito ao cálculo infinitesimal, dará a este último ponto toda sua significação.

NOTAS:

5 Los Estados múltiples del ser, cap. I

6 É em um sentido bastante próximo deste como Spinoza empregou mais tarde a expressão «infinito em seu gênero», que dá lugar naturalmente às mesmas objeções.

7 Se pode dizer também que não deixa fora dele mais do que a impossibilidade, a qual, ao ser um puro nada, não poderia limitar-lhe de nenhuma maneira.

8 Isto é igualmente verdade das determinações de ordem universal, e não já simplesmente geral, compreendido aí o Ser mesmo que é a primeira de todas as determinações; mas não há que dizer que esta consideração não intervém nas aplicações unicamente cosmológicas das que vamos ocupar-nos no presente estudo.

9 Se alguém estranha a expressão «semiprofano» que empregamos aqui, diríamos que pode justificar-se, de uma maneira muito precisa, pela distinção da iniciação efetiva e da iniciação simplesmente virtual, sobre a que teremos que nos explicar em outra ocasião.

10 Aqui citaremos só, como exemplo característico, o caso de L. Couturat que conclui sua tese De l’infini mathématique, na que se esforçou em provar a existência de um infinito de número e de magnitude, declarando que sua intenção nisso foi mostrar que, ¡«apesar do neocriticismo (isto é, das teorias de Renouvier e de sua escola), é provável uma metafísica infinitista»!

11 Em todo rigor lógico, há lugar a fazer uma distinção entre «falsa noção» (ou, se se quer, «pseudonoção») e «noção falsa»: uma «noção falsa» é a que não corresponde adequadamente à realidade, ainda que se lhe corresponde não obstante numa certa medida; ao contrário, uma «falsa noção» é a que implica contradição, como é o caso aqui, e a que assim não é verdadeiramente uma noção, nem sequer falsa, ainda que tenha a aparência disso para os que não se dão conta da contradição, já que não expressa mais do que o impossível, que é o mesmo que nada, não corresponde absolutamente a nada; uma «noção falsa» é susceptível de ser retificada, mas uma «falsa noção» não pode ser mais do que rechaçada pura e simplesmente.

12 Estes termos parecem querer recordar o secundum quid escolástico e assim, pudesse ser que a intenção primeira da frase que citamos tenha sido criticar indiretamente a expressão infinitum secundum quid.

13 Principes de la Philosophie, I, 26.

14 Ibid., I, 27.

15 É assim como Varignon, em sua correspondência com Leibnitz, a respeito do cálculo infinitesimal, emprega indistintamente as palavras «infinito» e «indefinido», como se fossem mais ou menos sinônimos, ou como se ao menos fora em certo modo indiferente tomar um por outro, enquanto, ao contrário, é a diferença de suas significações a que, em todas estas discussões, tivesse devido ser considerada como o ponto essencial.

16 Convém observar também que, como o explicamos em outra parte, um tal ciclo não é nunca verdadeiramente fechado, senão que parece sê-lo somente enquanto um se coloca numa perspectiva que não permite perceber a distância que existe realmente entre suas extremidades, de igual modo que uma espiral de hélice, segundo o eixo vertical, aparece como um círculo quando é projetada sobre o plano horizontal.

17 Por conseguinte, não serviria de nada dizer que o espaço, por exemplo, não poderia estar limitado mais do que por algo que seria também o espaço, de sorte que o espaço em geral já não poderia estar limitado por nada; ao contrário, está limitado pela determinação mesma que constitui sua natureza própria enquanto espaço, e que deixa lugar, fora dele, a todas as possibilidades não espaciais.

18 Cf. a precisão de A. K. Coomaraswamy sobre o conceito platônico de «medida», que citamos em outra parte (O Reino da Quantidade e os Sinais dos Tempos, cap. III): O «não medido» é o que ainda não foi definido, isto é, em suma o indefinido, e é, ao mesmo tempo e por isso mesmo, o que não está mais do que incompletamente realizado na manifestação.

CAPÍTULO II - A CONTRADIÇÃO DO “NÚMERO INFINITO”

Como o veremos ainda mais claramente a seguir, há casos em que basta substituir a idéia do pretendido infinito pela do indefinido para fazer desaparecer imediatamente toda dificuldade, mas há outros onde isso mesmo não é possível, porque se trata de algo claramente determinado, «fixado» de alguma maneira por hipótese, e que como tal, não pode chamar-se indefinido, segundo a observação que fizemos em último lugar: assim, por exemplo, pode-se dizer que a sucessão dos números é indefinida, mas não se pode dizer que um certo número, por grande que se lhe suponha e qualquer que seja a posição que ocupe nesta sucessão, é indefinido. A idéia do «número infinito», entendida como o «maior de todos os números», ou «o número de todos os números», ou também o «número de todas as unidades», é uma idéia verdadeiramente contraditória em si mesma, cuja impossibilidade subsistiria inclusive se se renunciasse ao emprego injustificável da palavra «infinito»: não pode haver um número que seja maior que todos os demais, já que, por grande que seja um número, sempre se pode formar um maior agregando-lhe a unidade, conformemente à lei de formação que formulamos mais atrás. Isso equivale a dizer que a sucessão dos números não pode ter um último termo, e é precisamente porque não está «terminada» pelo que é verdadeiramente indefinida; como o número de todos seus termos não poderia ser mais do que o último dentre eles, não se pode dizer tampouco que não é «numerável» (19), e essa é uma idéia sobre a qual teremos que voltar mais amplamente a seguir.

A impossibilidade do «número infinito» pode estabelecer-se ainda com diversos argumentos; Leibnitz, que ao menos a reconhecia muito claramente (20), empregava o que consiste em comparar a sucessão dos números pares à de todos os números inteiros: a todo número corresponde outro número que é igual ao seu dobro, de sorte que se podem fazer corresponder as duas sucessões termo a termo, de onde resulta que o número dos termos deve ser o mesmo em um e outro caso; mas, por outra parte, evidentemente há mais duas vezes números inteiros que números pares, já que os números pares se colocam de dois em dois na sucessão dos números inteiros; portanto, assim se conclui numa contradição manifesta. Pode-se generalizar este argumento tomando, em lugar da sucessão dos números pares, isto é, dos múltiplos de dois, a dos múltiplos de um número qualquer, e o raciocínio é idêntico; pode-se tomar também da mesma maneira a sucessão dos quadrados dos números inteiros21, ou mais geralmente, a de suas potências de um expoente qualquer. Em todos os casos, a conclusão à que se chega é sempre a mesma: uma sucessão que não compreende mais do que uma parte dos números inteiros deveria ter o mesmo número de termos que a que os compreende a todos, o que equivaleria a dizer que o todo não seria maior que sua parte; e, desde que se admite que há um número de todos os números, é impossível escapar a esta contradição. Não obstante, alguns creram poder escapar a ela admitindo, ao mesmo tempo, que há números a partir dos quais a multiplicação por um certo número ou a elevação a uma certa potência já não seria possível, porque daria um resultado que ultrapassaria o pretendido «número infinito»; há inclusive quem foram conduzidos a considerar efetivamente números chamados «maiores que o infinito», de onde teorias como a do «transfinito» de Cantor, que podem ser muito engenhosas, mas que por isso não são mais válidas logicamente (22): ¿é concebível que se possa pensar em chamar «infinito» a um número que, ao contrário, é tão «finito» que não é nem sequer o maior de todos?

Ademais, com semelhantes teorias, haviam números os quais nenhuma das regras do cálculo ordinário se aplicariam já, isto é, em suma, números que não seriam verdadeiramente números, e que não seriam chamados assim mais do que por convenção (23); é o que ocorre forçosamente quando, ao buscar conceber o «número infinito» de outro modo que como o maior dos números, consideram-se diferentes «números infinitos», supostos desiguais entre si, e aos que se atribuem propriedades que já não têm nada em comum com as dos números ordinários; assim, não se escapa a uma contradição mais do que para cair em outras, e no fundo, tudo isso nada mais é do que o produto do «convencionalismo» mais vazio de sentido que se pode imaginar.

Assim, a idéia do pretendido «número infinito», de qualquer maneira que se apresente e por qualquer nome que se a queira designar, contém sempre elementos contraditórios; ademais, não há nenhuma necessidade dessa suposição absurda desde que se faça uma justa concepção do que é realmente a indefinidade do número, e desde que se reconhece ademais que o número, apesar de sua indefinidade, não é aplicável de nenhuma maneira a tudo o que existe. Não vamos insistir aqui sobre este último ponto, já que o explicamos suficientemente em outra parte: o número nada mais é do que um modo da quantidade, e a quantidade mesma nada mais é do que uma categoria ou um modo especial do ser, não coextensivo (24) deste, ou, mais precisamente ainda, nada mais é do que uma condição própria de um certo estado de existência no conjunto da existência universal; mas é isso justamente o que a maioria dos modernos têm dificuldade para compreender, habituados como estão a querer reduzir tudo à quantidade e inclusive avaliar tudo numericamente (25). Não obstante, no domínio mesmo da quantidade há coisas que escapam ao número, assim como o veremos quando tratemos do contínuo; e inclusive, sem sair da consideração da quantidade descontínua, um (26) está já forçado a admitir, ao menos implicitamente, que o número não é aplicável a tudo, quando se reconhece que a multidão de todos os números não pode constituir um número, o que, ademais, não é em suma mais do que uma aplicação da verdade incontestável de que o que limita uma certa ordem de possibilidades deve estar necessariamente fora e além dessa ordem (27). Somente, deve entender-se bem que uma tal multidão, já se a considere no descontínuo, como no caso quando se trata da sucessão dos números, ou já se a considere no contínuo, sobre o que teremos que voltar um pouco mais adiante, não pode ser chamada de nenhuma maneira infinita, e que nisso não se trata mais do que do indefinido; ademais, é esta noção de multidão o que vamos ter que examinar agora mais de perto.

NOTAS:

19 Numerável: que pode ser numerado. Aurélio digital. N. do t.

20 «Apesar de meu cálculo infinitesimal, escrevia concretamente, eu não admito nenhum verdadeiro número infinito, ainda que confesso que a multidão das coisas ultrapassa todo número finito, ou mais corretamente todo número».

21 Isto é o que fazia Cauchy, que, Ademais, atribuía este argumento a Galileu (Sept leçons de Physique générale, 3ª lição).

22 Já, na época de Leibnitz, Wallis considerava «spatia plus quam infinita»; esta opinião, denunciada por Varignon como implicando contradição, foi sustentada igualmente por Guido Grandi em seu livro De Infinitis infinitorum. Por outra parte, Jean Bernoulli, no curso de suas discussões com Leibnitz, escrevia: «Si dantur termini infiniti, datibur etiam terminus infinitesimus (non dico ultimus) et qui eum sequuntu », o que, ainda que não se explique mais claramente aí, parece indicar que admitia que possa haver numa série numérica termos «além do infinito».

(23)Nisso não se pode dizer de nenhuma maneira que se trate de um emprego analógico da idéia do número, já que isto suporia uma transposição a um domínio diferente do da quantidade, e, ao contrário, é à quantidade, entendida em seu sentido mais literal, à que se referem exclusivamente todas as considerações deste tipo.

24 Coextensivo: commensurate, corresponding, proportionate, relative; comensurável, correspondente, proporcional, relativo. Fonte: http://www.babylon.com/definition/coextensivo/Spanish?uil=English. (Nota do tradutor.)

25 É assim como Renouvier pensava que o número é aplicável a tudo, ao menos idealmente, isto é, que tudo é «numerável» em si mesmo, ainda que nós sejamos incapazes de «numerá-lo» efetivamente; também se equivocou completamente sobre o sentido que Leibnitz dá à noção da «multidão», e nunca pôde compreender como a distinção desta com o número permite escapar à contradição do «número infinito».

26 “Um” é usado aqui e em outras passagens como “algo” ou “alguém”.

27 Dissemos, no entanto, que uma coisa particular ou determinada, qualquer que seja, está limitada por sua natureza mesma, mas nisso não há absolutamente nenhuma contradição: efetivamente, é pelo lado negativo desta natureza como ela está limitada ( já que, como disse Spinoza, «omnis determinatio negatio est»), isto é, enquanto esta exclui às demais coisas e as deixa fora dela, de sorte que, em definitivo, é a coexistência dessas outras coisas a que limita à coisa considerada; ademais, é pelo que o Todo universal, e só ele, não pode ser limitado por nada.

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